Comer com os pais faz bem, demonstram pesquisadores da UFU e da USP


Olenir Maria Mendes com a família: Guilherme José Gomes Carvalho, Antônio Augusto Mendes Carvalho, Ana Beatriz Mendes Carvalho e George Philip Green

O cuidado com a saúde, a alimentação e a prevenção à obesidade sempre foram temas de preocupação entre médicos e nutricionistas. A obesidade é um problema de saúde pública e atinge crianças e adolescentes em todo o mundo. No país, segundo dados da pesquisa “Prevalência de Obesidade em Crianças e Adolescente no Brasil”, de 2015, a prevalência de obesidade nessa faixa etária é de 14%. Um outro estudo, feito em 2014, pela Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE), realizada em parceria com o IBGE, mostrou que um em cada quatro adolescentes estava com sobrepeso e 8,4% já apresentavam obesidade.

Mas o que essas informações teriam a ver com a prática, por parte de crianças e adolescentes, de realizar refeições com as figuras paternas e/ou maternas? Bom, segundo a pesquisa “Fazer refeições com os pais está associado à maior qualidade da alimentação de adolescentes brasileiros”, tem tudo a ver. Publicado neste ano na revista Cadernos de Saúde Pública e desenvolvida pela professora Catarina Machado Azeredo, da Faculdade de Medicina (Famed) da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), em parceria com pesquisadoras das Faculdades de Saúde Pública e de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), o estudo concluiu que o hábito de realizar refeições com os pais é frequente entre adolescentes brasileiros e está associado à melhor qualidade da alimentação.

A pesquisa, que inclui os números sobre obesidade citados anteriormente, mostrou que entre os principais fatores de risco para obesidade está uma alimentação não saudável. “Sabemos que durante a infância e adolescência os hábitos dos pais são importantes determinantes para os hábitos dos filhos. Fazer as refeições com a família pode ser um fator de proteção para a saúde de crianças e adolescentes, de acordo com estudos realizados em outros países”, explica a professora.

Segundo Azeredo, o estudo teve como objetivo avaliar se adolescentes brasileiros que faziam as principais refeições (almoço e jantar) junto com os pais regularmente (5 vezes ou mais na semana) tinham melhor consumo alimentar comparados aos adolescentes que faziam as refeições junto com os pais menos frequentemente (menos de 5 vezes na semana).

Foram analisados os dados de 102.072 adolescentes matriculados no 9º ano do ensino fundamental de escolas públicas e privadas do Brasil que participaram da Pesquisa Nacional de Saúde do Escolar (PeNSE) de 2015. As informações foram coletadas a partir do uso de smartphones emprestados pela equipe do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Os Ministérios da Saúde e da Educação também colaboraram com a pesquisa.

A verificação indicou que os adolescentes que responderam afirmativamente sobre fazer refeições com os pais com maior frequência também relataram maior consumo de alimentos saudáveis, como feijão, frutas e hortaliças e menor consumo de guloseimas, salgados fritos e alimentos ultraprocessados, como: hambúrguer, presunto, mortadela, salame, linguiça, salsicha, salgadinhos de pacote, macarrão instantâneo e biscoitos salgados. O período em que essas informações foram coletadas foi de abril a setembro de 2015.

O trabalho realizado por Azeredo e a equipe de pesquisadoras da USP recebeu financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Na UFU, a pesquisa se vincula ao curso de Nutrição, na Faculdade de Medicina. A professora relata que a atuação em conjunto com a USP vem desde o doutorado. “Eu já trabalho em colaboração com pesquisadores do Departamento de Medicina Preventiva da Universidade de São Paulo em diversos estudos desde a realização do meu doutorado, que foi concluído na referida instituição,em 2015”, conta. “Além disso, sou pesquisadora vinculada ao Núcleo de Pesquisas em Nutrição e Saúde (Nupens) da Faculdade de Saúde Pública da USP. Este estudo foi coordenado pela pesquisadora Renata Bertazzi Levy, que me convidou para colaborar nas análises e revisão do artigo”, complementa.

No Brasil, segundo Azeredo, não havia estudos prévios quantitativos avaliando essa temática, o que colabora para a relevância da pesquisa. “Como os aspectos culturais que envolvem a alimentação e as relações familiares variam muito de um país para o outro, nós achamos que seria importante ver como fazer as refeições com os pais poderia impactar no consumo alimentar de adolescentes brasileiros”, observa.

Para a profissional da área da saúde, uma alimentação saudável é fator importante na prevenção de diversas doenças, como a obesidade, o diabetes, a hipertensão e doenças cardiovasculares. Reconhecendo a importância de promover ambientes alimentares saudáveis, recomenda-se identificar quais são as barreiras para o compartilhamento de refeições em família, uma vez que a prática tem papel fundamental na alimentação saudável.

“Os nossos resultados mostraram que comer junto com os pais foi associado com uma melhor qualidade da alimentação de adolescentes brasileiros, especificamente à maior frequência de consumo de feijão, frutas e hortaliças, e à menor frequência de consumo de guloseimas, ultraprocessados salgados e salgados fritos”, avalia Azeredo.

Para chegar a esses resultados, as pesquisadoras trabalharam no desenvolvimento de um escore de alimentação saudável, que somava pontos de acordo com a frequência de consumo dos alimentos saudáveis (feijão, frutas, hortaliças) e um escore de alimentação não saudável (guloseimas, ultraprocessados salgados, salgados fritos, refrigerantes e fast food). “Vimos que aqueles que realizavam refeições com os pais tinham maior escore de alimentação saudável e menor escore de alimentação não saudável. Mais de 70% dos adolescentes relataram fazer refeições com os pais em 5 ou mais dias”, reflete a professora.

Os próximos passos da profissional da saúde caminham em direção à continuação dos estudos sobre a alimentação dos adolescentes brasileiros com o objetivo de identificar fatores de risco e de proteção para uma alimentação saudável, visando ao subsídio de políticas públicas que possam melhorar o consumo da população brasileira. “Vários estudos mostram que os hábitos alimentares consolidados durante a infância e adolescência são adotados na vida adulta e, consequentemente, melhorar a alimentação na adolescência é importante fator de prevenção de doenças na vida adulta”, considera. O hábito de fazer as refeições em companhia, em local apropriado e com atenção (sem distrações como celulares e outras mídias) já é recomendado pelo Guia Alimentar para a População Brasileira.

A professora ainda menciona que, em 2019, uma nova edição da PeNSE está sendo realizada e em breve dados atualizados sobre os adolescentes brasileiros estarão disponíveis para a realização de novas pesquisas. Os interessados na pesquisa de Azeredo podem fazer o download do arquivo diretamente na revista Cadernos de Saúde Pública, sem custo. A PeNSE é financiada pelo Ministério da Saúde e os dados ficam disponíveis publicamente no site do IBGE sem custo e sem identificação dos participantes.

Comunica UFU