Pacientes com leucemia estão sem medicamento em Uberlândia e MPF ajuíza ação


O Ministério Público Federal (MPF) em Uberlândia (MG) ajuizou ação civil pública para que a União e o Estado de Minas Gerais disponibilizem ao Hospital de Clínicas da Universidade Federal de Uberlândia (HC-UFU) o medicamento Oncaspar, nome comercial da peg-aspargase ou asparaginase peguilada, utilizado no tratamento da leucemia infantil e adulta.

De acordo com a ação, há diversos pacientes, principalmente crianças, aguardando o medicamento, alguns deles inclusive com agravamento do quadro clínico.

O Oncaspar é indicado como um dos componentes da terapia de pacientes com leucemia linfoblástica aguda, que acomete mais de 4.000 crianças por ano no Brasil e representa cerca de 85% dos casos de leucemias em crianças, de acordo com a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

A ação do Oncospar combinado com outros medicamentos está associada a taxas de cura de 70 a 90% dos casos, o que cai para taxas inferiores a 50% quando um dos componentes da quimioterapia não tem eficácia, o que, para o MPF, comprova ser o pegaspargase “de fundamental importância para a remissão e cura da doença”.

Defasagem – O desabastecimento da asparaginase nos hospitais públicos teve início em 2012, o que levou o Ministério da Saúde (MS) a concentrar o fornecimento do quimioterápico somente aos centros de tratamento. Em caráter de urgência, definiu-se pela importação do medicamento chinês Leuginase, o que à época foi objeto de inúmeras ações judiciais, inclusive do próprio MPF, devido à falta de confiabilidade na eficácia do produto chinês.

Em 2017, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) concedeu registro ao Oncaspar, possibilitando a importação do produto pelo Ministério da Saúde, mas, em janeiro de 2018, portaria do MS devolveu aos hospitais habilitados em oncologia a responsabilidade pela aquisição e fornecimento do Asparaginase.

A mesma portaria estabeleceu a desagregação dos procedimentos inicial e de manutenção no tratamento quimioterápico, estabelecendo valores diferentes para cada um. “O problema é que o valor definido para a Autorização de Procedimento de Alta Complexidade foi inferior ao valor necessário para comprar a asparaginase”, afirma o procurador da República Cléber Eustáquio Neves, autor da ação, situação agravada pela defasagem no reajuste da tabela do SUS para a Oncologia.

“A título de exemplo, cada paciente pediátrico utiliza cerca de cinco ampolas, ao custo total de R$ 31.650, mas a autorização do procedimento tem valor de apenas R$ 23.250, obrigando o HC a complementar o valor para poder atender os pacientes”, explica Cléber Neves.

Dados fornecidos pelo hospital revelam que o valor anual gasto na compra do remédio para o tratamento da leucemia tanto em crianças quanto em adultos ultrapassa os 880 mil reais, o que acabou agravando a situação econômico-financeira da instituição, que, endividada, deixou de adquirir o medicamento.

O MPF informa que, para agravar mais a situação, o Setor de Oncologia do HC-UFU, recebe em média cinco adultos e 14 novos pacientes pediátricos por ano, mas, como a compra do medicamento é regulada mensalmente, por se tratar de fornecedor único e com validade de apenas seis meses, não pode ser feito estoque do produto.

De acordo com o procurador da República, “o que se percebe é que o Ministério da Saúde, ao efetivar a desagregação dos procedimentos, transferiu indevidamente aos já combalidos hospitais oncológicos o ônus de arcarem com o custo total do tratamento sem o justo ressarcimento pelo custo real dos quimioterápicos. Na prática, o Ministério da Saúde transferiu uma responsabilidade aos hospitais, que até então era sua, mas sem dotá-los dos recursos necessários ao adequado custeio das despesas, tudo isso às custas dos riscos à vida de milhares de pacientes”.

Pedidos – O MPF pede liminar obrigando a União e o Estado de Minas Gerais a disponibilizarem, no prazo de 10 dias, o medicamento Oncospar para o Hospital das Clínicas da UFU, em quantidade suficiente para atender o mínimo de 36 pacientes, adultos e pediátricos, durante a primeira e segunda fases do tratamento.

Caso os réus não cumpram essa ordem, a ação pede que eles sejam obrigados a depositar um milhão de reais em conta judicial vinculada ao processo, para aquisição do medicamento ao longo de 2019.
E, caso também se recusem a efetuar esse depósito, o MPF pede o bloqueio de quantia equivalente nas contas dos entes públicos.

Ministério Público Federal