Finalista da Europa League, Rangers protagoniza rivalidade motivada por religião


Time escocês, que vai a campo nesta quarta-feira (18), tem rixa centenária com o Celtic, fundado pelo católico Andrew Kerins

Finalista da Europa League, o Rangers protagoniza uma das maiores rivalidades do futebol mundial diante do rival local Celtic, na Escócia. Parte do antagonismo se explica na origem dos clubes e por seus pontos de vista políticos. Enquanto o Rangers é protestante e seus torcedores apoiam a permanência escocesa no Reino Unido, o Celtic é católico e seus adeptos são separatistas em relação ao Estado britânico.

“Desde 1707, com o Tratado da União, Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte fazem, junto com a Inglaterra, parte do Reino Unido. Durante todo o século XVIII, o fluxo migratório entre esses países ocorreu, e no caso da Escócia, existe uma particularidade: os protestantes e católicos da Irlanda do Norte migraram para a Escócia, e o que se viu, ainda no século XVIII, foi o crescimento de discursos anti-catolicismo e anti-protestantismo na sociedade escocesa. Essa rivalidade, ou sectarismo, se arrastou por séculos”, explicou o historiador Victor de Leonardo Figols.

“Quase um século depois, os primeiros clubes e a primeira liga de futebol foram criados naquele país. Em 1873, foi fundado o Rangers, um clube que desde muito cedo assumiu o protestantismo e um discurso anti-católico, reflexo das tensões que a sociedade escocesa vivia. Anos depois, em 1888, o Celtic foi fundado por um marista, com apoio da comunidade católica escocesa, e por imigrantes irlandeses, também católicos”, complementou.

Em 1910, de maneira não oficial, o Rangers adotou uma política de não contratar jogadores católicos. A restrição só foi interrompida em 1989, quando o clube contratou Mo Johnston que, além de ser católico, havia jogado no Celtic.

“O jogador foi duramente perseguido pelas duas torcidas, tendo sido ameaçado de morte tanto por torcedores católicos, quanto por protestantes”, recordou Victor.

Intolerância entre os torcedores de Rangers e Celtic resultou em diversos conflitos. Foto: Ian Rutherford /AP

A intolerância entre os torcedores de Rangers e Celtic resultou em diversos conflitos. O maior deles ocorreu em 1971, quando um incêndio nas arquibancadas do antigo Ibrox Park, hoje chamado de “Ibrox Stadium”, provocou um grande tumulto, ferindo mais de 200 pessoas e causando a morte de 66 pessoas. Já em 1980, uma grande briga generalizada tomou conta do estádio Hampden Park após o título do Celtic na final da Copa da Escócia.

A rivalidade só veio a perder força em 2005, quando ambos os clubes lançaram o programa Old Firm Alliance, para ensinar as crianças sobre igualdade, diversidade e tolerância no futebol e na sociedade. “Foi uma tentativa de combater o sectarismo presente na sociedade escocesa e nos dois clubes”, explicou o historiador.

Outro fator que influenciou para a mitigação da rivalidade foi a falência do Rangers, em 2012. A ruína financeira fez com que o clube caísse para a quarta divisão nacional, e os clássicos contra o Celtic, consequentemente, perdessem frequência. O retorno à elite só foi ocorrer em 2016.

“O Rangers foi refundado e iniciou sua trajetória no futebol profissional escocês na quarta divisão escocesa. E demorou quatro anos para voltar à elite do futebol escocês. Devido às diferenças de divisão, durante esse período, os Rangers e Celtics disputaram alguns poucos jogos das copas nacionais, e claro, ainda cheio de rivalidade”, disse Victor, que complementou:

“Atualmente, a rivalidade, que ainda se mantem no sectarismo, ganhou novos elementos com o a discussão sobre a emancipação da Escócia do Reino Unido e o debate sobre a unificação das Irlandas. Os torcedores do Rangers defendem a permanência e manutenção da Escócia no Reino Unido, enquanto os torcedores do Celtic defendem a independência da Escócia. Sobre o debate das Irlandas, os torcedores do Celtic e a maioria dos católicos irlandeses defendem a unificação das Irlandas. Já os torcedores do Rangers discordam, pois temem perseguições aos protestantes da Irlanda do Norte, coisa que já aconteceu no passado.”