Servidores cobram regulamentação do combate ao assédio moral


Assunto foi debatido, na terça-feira (5), em audiência da Comissão Extraordinária das Mulheres – Fonte: Willian Dias

Apesar de Minas Gerais já contar com a Lei Complementar 116, de 2011, que estabelece mecanismos para prevenção e punição do assédio moral na administração pública estadual, a norma ainda não foi regulamentada em diversas instituições. A cobrança por essa regulamentação, assim como por um aperfeiçoamento da legislação que trata tanto do assédio moral quanto do sexual, marcou os pronunciamentos da maioria dos participantes de audiência pública realizada pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), na terça-feira (5), para discutir o tema.

A reunião foi organizada pela Comissão Extraordinária das Mulheres, presidida pela deputada Marília Campos (PT). Logo no início, a deputada ressaltou que a regulamentação da lei complementar já aconteceu nos Poderes Executivo e Judiciário, mas ainda precisa ocorrer tanto no próprio Legislativo quanto no Ministério Público e na Defensoria Pública.

A deputada Geisa Teixeira (PT), que também participou da reunião, lembrou que o assédio moral, ainda que muito frequente, permanece velado na maioria das vezes, em razão do medo que os assediados têm de retaliações. Ela também ressaltou que os casos geram frequentes danos psicológicos às vítimas, um sofrimento que pode permanecer por longo tempo.

A preocupação da comissão com o assédio moral, segundo a deputada Marília Campos, se explica em função de as mulheres serem as mais vulneráveis a esse tipo de agressão.

Sua fala foi reforçada por dados apresentados por uma das participantes da reunião, a servidora Ana Paola Amorim, membro do Coletivo de Mulheres da ALMG. Segundo Ana Paola, levantamentos realizados nos Estados Unidos mostram que, em 90% dos casos de assédio moral, as agressões partem de homens contra mulheres. “Por isso, o pesquisador Flávio da Costa Higa considera que o assédio moral é uma forma de discriminação de gênero”, afirmou a servidora.

Constatação semelhante veio da defensora pública Cibele Lopes, assessora institucional da Defensoria Pública. Segundo ela, o assédio moral sempre atinge com mais força as pessoas mais vulneráveis. Apesar da falta de regulamentação e das deficiências da legislação, a defensora afirmou que Minas Gerais ainda está à frente nessa questão, uma vez que falta legislação específica em nível federal.

Legislação contra estupro precisa ser aperfeiçoada

Cibele Lopes ressaltou também a necessidade de se aperfeiçoar a legislação não apenas no que se refere ao assédio moral, mas também ao assédio sexual e ao estupro. Ela lembrou caso recente em que um homem ejaculou sobre uma mulher dentro de um ônibus, na cidade de São Paulo. O homem acabou liberado pela Justiça, sob o argumento de que não teria ocorrido violência. “É constrangimento sim, é violência sim, ejacular em uma mulher contra a vontade dela”, indignou-se a defensora.

A regulamentação da Lei Complementar 116 na Assembleia Legislativa foi uma das reivindicações apresentadas pela servidora Grazielle Mendes, uma das representantes dos servidores efetivos na Câmara de Recursos Administrativos de Pessoal da ALMG. Em documento encaminhado à comissão, também se reivindicou, entre outros pontos, a redução da discricionariedade nas regras do Manual do Efetivo, a partir da padronização de normas.

A coordenadora-geral do Sindicato dos Trabalhadores nas Instituições Federais de Ensino (Sindifes), Cristina Del Papa, relatou a experiência da UFMG e outras universidade federais no combate ao assédio moral e sexual.

Ela afirmou que a conscientização ainda é necessária, pois há muita confusão sobre o que é assédio moral, algo que pressupõe a prática reiterada de procedimentos e palavras que submetem o trabalhador a uma situação humilhante.

Segundo Cristina, a experiência da UFMG mostra que o engajamento das direções dos órgãos públicos e instituições na luta contra o assédio é fundamental para inibir agressões por parte das chefias.

Em sua avaliação, a forte hierarquização e a existência de servidores que permanecem por longo tempo em cargos de chefia favorecem abusos no serviço público.

Servidoras dizem que decreto do Executivo apresenta falhas

Apesar de o Executivo já ter regulamentado o combate ao assédio moral, por meio do Decreto 46.060, de 2012, essa norma não escapou de críticas. A secretária-adjunta de Estado de Casa Civil e Relações Institucionais, Mariah Brochado Ferreira, criticou o fato de o decreto exigir a autorização expressa do ofendido para atuação do sindicato nos casos relatados. Ela também considera que as regras não garantem o sigilo dos casos e o anonimato das vítimas.

Outra representante do Executivo foi Letícia Silva Palma, integrante do Coletivo Jacintas, grupo de mulheres criado em 2015, a partir de uma denúncia de estupro. Ela criticou o fato de não haver nenhuma capacitação específica para os servidores que integram as comissões formadas para analisar as denúncias recebidas. Também afirmou que não há um acompanhamento adequado para as servidoras que se queixam de abusos e que a prevenção ainda é muito precária.

Entre os representantes do Ministério Público, a promotora de Justiça Nívea Mônica da Silva ressaltou que cabe a todos cobrar a regulamentação dessa questão dentro de cada instituição. O coordenador-geral do Sindicato dos Servidores do Ministério Público (Sindsemp-MG), Eduardo de Souza Maia, frisou que nada adianta uma normatização perfeita se não houver uma conscientização dos servidores.

A delegada-chefe da Divisão Especializada de Atendimento à Mulher, Idoso e Pessoas com Deficiências da Polícia Civil, Danúbia Quadros, ressaltou a importância da denúncia, tanto no caso do assédio moral quanto do sexual. “Porque atrás de nós há muitos outros casos, que podemos prevenir e evitar”, afirmou. Ela disse acreditar que, em breve, pode ser criada uma delegacia especializada para atender a população LGBT.

Requerimentos – Ao final da reunião, foi aprovado o envio de ofícios a diversas instituições do Estado, questionando se elas vêm observando o disposto na Lei Complementar 116. Receberão a correspondência o Ministério Público, a Defensoria Pública, o Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG), a Copasa e a Cemig.

Foram aprovados, ainda, seis requerimentos de autoria da deputada Marília Campos para realização de audiências de convidados. As reuniões são para discutir eleições e participação política das mulheres; tráfico de pessoas, em especial de mulheres e bebês; violência contra mulheres LGBT; orçamento destinado a políticas públicas para as mulheres; situação de mulheres privadas de liberdade; e investimentos na estrutura dos conselhos tutelares.

Assembleia Legislativa de Minas Gerais